quinta-feira, 7 de fevereiro de 2008

Reflexões sobre a expulsão do Gragoatá

Neste momento de grande perplexidade e indignação sentida por aqueles que, verdadeiramente, apóiam o Acampamento Maria Julia Braga e a seu lado, em diferentes circunstâncias, empreenderam combate sistemático ao conjunto de políticas privatizantes promovida pela presente REItoria, faz-se necessário um aprofundamento da análise sobre o fenômeno em questão uma vez que, dessa maneira, conseguiremos extrair deste as lições necessárias que nos permitirão ver, com a devida nitidez, os reais contornos que estão por trás da covarde ação de despejo sofrida pelo AMJB na sexta feira, 01 de fevereiro, véspera de carnaval e a partir dela elaborarmos a contra-ofensiva aos nossos inimigos de classe e a seu projeto degenerado de poder!

Há três dias de completar 1 ano e dez meses de existência o Acampamento Maria Julia Braga- o Quilombo do séc XXI – foi vítima de um duro golpe empreendido pela reitoria de Roberto Salles e Emmanuel. A ação foi calculada em seus mínimos detalhes. Só nos foi concedido dez minutos para que realizássemos a retirada de nossos pertences, razão pela qual fomos obrigados a aceitar que estes fossem levados para algum depósito por nós desconhecido, sem que pudéssemos sequer ter uma cópia da listagem dos pertences apreendidos e levados por caminhões da própria universidade. Temendo uma possível retaliação por parte dos membros combativos da Comunidade Acadêmica os executores da ação de despejo impediram a entrada de dois jornalistas (uma da ADUFF e outro do jornal O Fluminense) e como bem se lê na nota emitida pela ADUFF no dia do ocorrido: “a jornalista da ADUFF foi agredida e retirada à força do interior do campus, sendo ameaçada por um policial de ser detida por desacato à autoridade. As duas empresas de segurança (Centauro e Croll) terceirizadas, que prestam serviços à UFF utilizaram de força para impedir o acesso da imprensa e de diretores da ADUFF no campus para acompanharem a operação policial.”

Diante da macabra situação faz-se necessária a indagação coletiva “O QUE HÁ POR TRÁS DA LUTA DO ACAMPAMENTO CAPAZ DE IMPOR TANTO MEDO AO REITOR E SEUS ASSECLAS AO PONTO DE LEVÁ-LOS A COMETER UM ATO TÃO VIL E COVARDE COMO ESSE?” No objetivo de responder a questões como essas foram redigidas as linhas que se seguem.

Uma breve análise das razões que nos motivam a empreender tal luta.

Apesar do longo período que dedicamos para a efetuação de tarefas de esclarecimento da luta que estamos promovendo ainda é comum observarmos o quanto a mesma é percebida de maneira truncada. Os argumentos levantados com freqüência por alguns são de que estávamos acampados, única e exclusivamente, por razões de natureza econômica, faltando portanto, a quem toca essa luta no cotidiano, discernimento maior sobre as demais causas que envolvem o dia a dia da universidade assim como da sociedade como um todo. As pessoas que comungam deste ponto de vista, certamente, desconhecem a nossa trajetória política ou sofrem a influência tanto dos setores de direita que devido ao projeto de universidade que defendemos necessita nos detratar, como também de frações da esquerda tradicional que temendo perder espaço, contribuem, muitas das vezes, para reforçar preconceitos e estigmas nas mentes dos que ainda não adquiriram uma consciência crítica o suficiente para observar as contradições daqueles que no plano do discurso assumem posições socialistas mas que, na prática, são os primeiros a contribuir para a derrota das ações e projetos de transformação que se efetuam a partir da ação direta e pela base.

Ainda na administração de Cícero, a REItoria, no intuito de paralisar o movimento por nós constituído, ofereceu bolsas para o conjunto dos estudantes do Acampamento vinculados à universidade. Se nossos interesses se baseassem pelos aspectos econômicos, então por que em tal ocasião não aceitamos as bolsas como forma de aplacarmos nossos problemas? Como bem afirmamos na ocasião em questão partimos da premissa de que a questão da moradia é um problema historicamente vivido por diversas gerações de estudantes que passaram pela UFF e neste sentido se continuamos a lutar é evidente que não o fazemos pensando exclusivamente em nosso bem-estar mas sim em solucionarmos uma problemática central no seio de nossa universidade de modo a fazer com que esta instituição ofereça as condições necessárias ao acesso e permanência com boa qualidade para o conjunto de seus estudantes. A luta pela moradia é na verdade uma luta por Assistência Estudantil e em uma conjuntura na qual predomina a lógica privatista neoliberal, lutar por tais pautas é na verdade se contrapor às políticas que precarizam a universidade pública. Isto se torna evidente ao analisar que nacionalmente o setor combativo do Movimento Estudantil (ME) promoveu importantes batalhas contra os executores de tais políticas representados no Governo Federal e nas suas respectivas REItorias. Tendo por pauta a questão da Assistência Estudantil, as ocupações de REItoria foram a principal forma de travar estes embates, e no caso da UFF, foi o AMJB o maior protagonista deste processo no ano de 2007. Portanto, aqueles que insistem em defender a tese de que não lutamos pelas demais bandeiras do movimento estudantil ou desconhecem completamente nossa história ou agem assim por pura intencionalidade inescrupulosa!

O projeto hegemônico de universidade e o projeto que defendemos

Desde o começo de sua gestão, a REItoria de Roberto Salles e Emmanuel tem se empenhado para através de mecanismos despolitizadores apresentar a UFF sem os diversos problemas ora existentes. Por meio de uma campanha capciosa chamada oficialmente de “Programa de Acolhimento Estudantil” busca ludibriar e convencer os estudantes recém ingressados de que sua administração tem avançado na perspectiva de implantar um projeto de universidade de altíssima qualidade como bem afirma o reitor em sua carta aos calouros:

“(...) A UFF, com pouco mais de 45 anos de existência, já figura entre as maiores universidades federais do país. De fato, temos atuação nas diversas áreas do conhecimento, por meio de 55 cursos de graduação, 42 cursos de mestrado, 23 cursos de doutorado, 143 cursos de especialização e 25 cursos de MBA. Além disso, contamos com cerca de 400 grupos de pesquisa credenciados no CNPq, número que cresce a cada dia em função de novas pesquisas que estão sendo desenvolvidas.

Desta forma, nossa universidade está plenamente capacitada a desempenhar o seu papel na formação de alunos, na produção de novos conhecimentos pelos nossos cientistas e na formulação de soluções para os diversos problemas apresentados pela sociedade. E ficamos felizes, hoje, de podermos contar com a presença de vocês em nosso corpo estudantil.

Estamos certos de que a passagem pela UFF nos próximos anos será enriquecedora para a formação pessoal e profissional de vocês, e de que em breve estarão atuando na sociedade como profissionais de excelência, enfrentando desafios e exercendo a cidadania por meio da consciência crítica e da responsabilidade social. A UFF não se preocupa apenas com a formação profissional, mas também com a preparação para o exercício pleno da cidadania. (...)”

Primeiramente, Salles em sua carta visa demonstrar a grandiosidade da universidade através de dados numéricos. Considerando tais dados apresentados, podemos observar um importante elemento que ele deixa de lado: o caráter destes cursos. Se somados os cursos de graduação a todos os de mestrado e doutorado alcançamos a marca de 120 cursos, os quais se tratam de cursos gratuitos e imprescindíveis para o funcionamento da universidade. No entanto, este número (120) não alcança o número de cursos de especialização (143). É importante percebermos que dentre estes últimos encontramos uma enorme quantidade de cursos pagos os quais além do espaço físico utilizam também o nome da UFF para agregar valor a tais cursos pois sem a logomarca desta universidade teriam de cobrar mensalidades bem mais baixas. Isto sem falar da Fundação Euclides da Cunha, cuja existência torna possível a implantação dos mesmos e cujo histórico é notório pelas tramas de corrupção e coação, reconhecidas até mesmo pelo Conselho Universitário, ainda que este reconhecimento seja fruto das disputas interinas promovidas pelos burocratas que atuam no CUV e concomitantemente na FEC que tais quais ratos em busca de queijo se digladiam pelos recursos provenientes destes cursos. Quanto aos 25 cursos de MBA, dispensam maiores comentários, basta o fato de serem cursos caríssimos que atuam nas principais “áreas de mercado”, contribuindo assim para o enriquecimento de corporações e demais capitalistas.

Portanto, a última coisa que podemos fazer é levar o conteúdo da carta de Roberto Salles em consideração pois a mesma, na melhor das hipóteses, não passa de um trote lançado aos calouros que chegam a cada início de semestre na UFF. A realidade se mostra diametralmente oposta e para comprovarmos isso basta que confrontemos uma passagem da carta em questão, eis novamente a mesma: “Desta forma, nossa universidade está plenamente capacitada a desempenhar o seu papel na formação de alunos, na produção de novos conhecimentos pelos nossos cientistas e na formulação de soluções para os diversos problemas apresentados pela sociedade.” Como pode o Reitor afirmar uma tese como essa se o mesmo promove o despejo de estudantes que reivindicam Moradia Estudantil e que há mais de um ano estavam morando em barracas, debaixo de chuva e sol, reivindicando, legitimamente, condições de acesso e permanência para os que aqui chegam sem meios para se manter, cobrando, enfim, uma promessa de campanha que o mesmo fez e que até agora não cumpriu?! Na verdade, por tudo o que já efetuamos, representamos uma ameaça à continuidade do projeto degenerado de poder cristalizado na figura dessa REItoria e nisso consiste o ataque covarde e desesperado por esta promovida contra o nosso Movimento de Luta. O Acampamento, com sua estética precária, significava a denúncia viva das contradições que agora Roberto Salles sonha em ocultar da sociedade, e pensando em tal objetivo promoveu a ação de despejo na perspectiva de apagar da memória coletiva a existência desse importante movimento de contestação estudantil e social.

Nosso projeto de universidade se choca com o defendido por essa canalha parasitária instalada na UFF e nas demais universidades brasileiras na medida em que estes querem continuar o processo de privatização em curso e subordinar tais instituições aos desígnios do mercado e para tal farão de tudo para que as demandas que avançam para uma perspectiva socialista nunca ganhem materialidade. Defendemos uma universidade comprometida com as demandas do proletariado e com as lutas que caminham em direção a sua emancipação social. Acreditamos que a universidade deva contribuir para o pleno desenvolvimento humano dos seus membros e que a mesma produza conhecimentos que sejam úteis para o combate e superação das mazelas sociais ora existentes. Coerentes com tal princípio político lançamos o mote Fora Salles! O CUV não nos representa! Pela construção da Assembléia Comunitária na UFF Já!

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